Sou uma mulher negra, 40 anos de idade que descobriu aos 20 a potência que era ser MULHER PRETA. Mãe de 2 filhas e um filho, Casada, Enfermeira e Professora do Curso de Enfermagem da UEFS (Universidade Estadual de Feira de Santana- BA.) Considero-me uma mulher empoderada, mas permaneço resiliente para nutrir essa força motriz que existe em mim e que molda o SER MULHER negra no Brasil.
A consciência racial da mulher negra as vezes demora a chegar, vem ao longo dos anos, como foi no meu caso! Intelectuais negras como Lélia Gonzalez, Beatriz Nascimento e Angela Davis sempre ensinaram, que não se nasce mulher, torna-se mulher, e para mulheres negras é sempre mais desafiador.
Somente aos meus 20 anos, pude perceber que as minhas inquietações não eram apenas porque eu era considerada a “ovelha negra da família” como eu era chamada por alguns de forma pejorativa, por não me aquietar e nem aceitar como nós mulheres negras eram tratadas e /ou recebiam da sociedade. Essas inquietações perpassavam por questionamentos do que eu queria ser, ter mais autonomia, poder e autoridade sobre meu corpo e minhas escolhas, porém a época isso soava destoante aos padrões legais para uma jovem negra, mesmo após as lutas de nossos ancestrais.
Considero que a base familiar me deu lastro para permanecer na fé que eu um dia chegaria lá!! Minha mãe, uma mulher negra super ativa e altiva, criou suas 3 filhas com muito amor e fé nos guiou no trilhos do estudo. Lembro-me que quando passava o carro na porta vendendo livros, ela comprava as coleções e dizia é para vocês crescerem e serem profissionais brilhantes!. Sou muito grata a ela e a todas as mulheres da minha família e outras que passaram na minha vida e que creditaram em mim uma esperança para eu galgar dias melhores.
Mas … eu passei metade da minha vida atual sendo essa mulher “ não empoderada” mas lutando contra o que a sociedade nos impunha.
A busca por equidade na nossa sociedade é gritante e imensa para galgá-la.!!!
E aos vinte anos conheci uma mulher negra, atualmente minha cumadre, que me fortaleceu inicialmente sobre questões raciais e descortinou minha visão para iniciar meu crescimento para construção de uma consciência racial, assim como ela, outros e outras pessoas pretas que me rodeavam e já tinham adquirido letramento racial , estiveram na torcida para meu crescimento intelectual também, o que me levou ao primeiro passo do meu Empoderamento.
Iniciei participando das reuniões do movimento negro em Feira de Santana ( FRENEFE – 2001). As leituras e discussões deste movimento ampliavam meu olhar para a ciência e letramento racial. Não foi fácil construir e reconstruir vinte anos já vividos, mas foi super importante saber o quanto eu valia para mim e para outros.
Nós fomos ensinados que “nossa carne é a mais barata do mercado” mas vivemos a desmitificar isso!!
E foi assim, que em 2003, que eu Ellen Alcântara, acessei a Universidade privada com apoio do FIES, quebrando muitos paradigmas iniciando meus estudos no curso de Enfermagem da Faculdade Tecnologia e Ciências. Não parei de estudar! Educação Liberta!
A seguir fiz, 2 especializações, uma em Administração hospitalar na UFBA (2011) e a outra em Obstetrícia na EESP- Ba (2018). Trabalhando e estudando percebi a necessidade de ir mais longe e prosseguir, Após várias tentativas para acessar o Mestrado na Bahia, passei onde Deus me direcionou. Fiz seleção no Instituto Fernandes Filgueiras – RJ ( FIOCRUZ) Na pesquisa do Mestrado ouvir a voz de mulheres pretas, que relataram as violências que foram acometidas durante o pré-natal, parto e puerpério em FSA/BA. Defendi em 2017 a dissertação intitulada: A violência Obstétrica a mulheres negras em Feira de Santana. Todos estes cursos pós-graduação foram pagos pelos Governos Estadual e Federal.
Atuei na assistência de Enfermagem nos âmbitos Municipal, Estadual e Federal. Atualmente atuo na Docência, atividade que amo fazer, no componente Saúde da mulher do curso de Enfermagem – UEFS e no Empreendedorismo, do ramo de Calçados e Acessórios femininos, administro a Loja MOSI. Amo essa troca com mulheres, seja na docência, na assistência, no empreendedorismo e na vida.
Eu me fortaleci e me empoderei a partir de mulheres ancestrais e atuais potentes e resilientes.
Seja você também essa pessoa que fortalece e empodera outras mulheres.!!
“Que nada nos limite, que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja nossa própria substância, já que viver é ser livre.” Simone Beavouir
Ellen Alcântara é Docente do curso de Enfermagem – UEFS, Mestra em Saúde da Mulher – IFF/ Fiocruz RJ e Adm. MOSI Calçados e acessórios femininos