Especialistas ouvidos pelo g1 consideram que o presidente eleito terá de ser comedido com os gastos públicos por conta do Congresso ‘mais bolsonarista’. Lula acenando para apoiadores em discurso após a vitória no segundo turno
Fábio Tito/g1
Com 50,90% dos votos válidos, Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito, pela terceira vez, o presidente do Brasil e deve reassumir o cargo no próximo dia 1° de janeiro. Entre os diversos desafios políticos, sociais e econômicos que Lula terá pela frente, um dos mais importantes é o controle da inflação brasileira.
O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), indicador oficial da inflação do país, era de 7,17% no acumulado em 12 meses até setembro de 2022, depois de registrar contração por três meses consecutivos. Apesar da sequência de quedas, a inflação nacional para 12 meses continua muito acima da meta do Banco Central (BC), de 3,50%.
Os impactos socioeconômicos trazidos pela pandemia de Covid-19, o aumento dos gastos do atual governo e a guerra da Rússia na Ucrânia ajudam a explicar a pressão inflacionária vivida pelo Brasil. Mas especialistas ouvidos pelo g1 consideram que é importante dividir o futuro em curto, médio e longo prazo.
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De acordo com Carla Argenta, economista-chefe da CM Capital, a tendência para a inflação no curto prazo, ao longo do próximo ano, já está definida e é uma tendência de desaceleração.
“O que pode mudar de Jair Bolsonaro para Lula é a intensidade com a qual a inflação vai cair, com Lula provavelmente os preços vão cair um pouco menos”, explica.
A especialista pontua que a principal diferença entre a forma dos dois políticos governarem no que diz respeito à economia é que, enquanto Bolsonaro tem uma visão mais liberalista, “é característico do governo do PT trazer para dentro da economia a pirâmide social”.
“No liberalismo, a característica é que haja uma ajuda mais modesta do Estado para a população, originando uma demanda menor, o que deixa a inflação mais baixa. Já com o Lula, a demanda agregada tende a ser maior, pois há mais apoio econômico à população, o que aumenta seu poder de compra e pode deixar a inflação um pouco mais alta”, afirma a economista.
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A força do Banco Central do Brasil
Carla destaca que, no curto prazo, mesmo com essa diferença, os preços tendem a desacelerar. Isso porque a inflação responde a dois principais fatores: o cenário internacional, que passou a adotar uma postura mais restritiva com a política monetária justamente com o objetivo de frear o avanço dos preços, e ao cenário de juros dentro do próprio Brasil.
Atualmente, a Selic, taxa básica de juros, está em 13,75% ao ano e, segundo o último comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, deve permanecer em patamares elevados ainda por algum tempo, na tentativa de trazer a inflação de volta para o centro da meta nos próximos anos.
Mauro Morelli, estrategista-chefe da Davos Investimentos, ressalta que o BC já vem adotando uma postura mais restritiva em relação aos juros há algum tempo, mas o efeito ainda está por vir.
“Os impactos das decisões do BC tendem a demorar entre 12 e 18 meses para serem sentidos na economia real, por isso só vamos conseguir sentir o poder da alta dos juros contra a inflação principalmente em 2023”, diz.
Acilio Marinello, especialista da Trevisan Escola de Negócios, explica que o aumento dos juros torna os financiamentos e processos de tomada de crédito mais caros, o que tende a reduzir o consumo da população — ponto essencial para a queda da inflação.
Mas é consenso entre os especialistas que o Brasil possui um Banco Central “forte e independente”, que vai continuar monitorando a inflação de forma a mantê-la controlada.
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Combustíveis ainda são um risco?
Ao longo de todo o primeiro semestre de 2022, os combustíveis foram os grandes vilões da inflação, com uma série de reajustes praticados pela Petrobras como consequência da disparada dos preços do petróleo nos mercados internacionais.
Para resolver parte desse problema, em junho deste ano entrou em vigor a legislação que limita as alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Produtos (ICMS) sobre itens considerados essenciais, como os combustíveis e a energia elétrica.
Segundo Conrado Lima, diretor da Stonex Asset Management, embora a proposta de tal legislação tenha vindo de Bolsonaro, Lula pode não mudar as regras porque poderia ser negativo para seu governo.
Ainda assim, a Petrobras ainda pode voltar a anunciar alguns reajustes para cima no preço dos combustíveis, porque as altas ficaram represadas após uma nova valorização do petróleo no exterior.
Mesmo que isso aconteça, Mauro Morelli aponta que os impactos sobre a inflação brasileira não devem ser tão fortes, desde que o dólar e o petróleo não voltem a subir exacerbadamente.
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Futuro de médio e longo prazo
Sobre o futuro de médio e longo prazo, é consenso entre os especialistas que a inflação vai depender muito de como será o trato do presidente eleito com as contas públicas.
Segundo Lima, ainda é muito cedo para dizer como será a gestão do risco fiscal no governo Lula, principalmente porque ainda não se sabe quem estará em sua equipe econômica. No entanto, o especialista pontua que o mercado espera que o presidente adote uma postura mais expansionista com a economia.
Para ele, o maior risco para a inflação é que o governo do PT tente fazer com que o Brasil cresça muito, e rápido, o que aumentaria a quantidade de benefícios sociais sem respeitar o controle das contas públicas.
Mas Lima pondera que o Congresso e o Senado, essenciais para a aprovação de qualquer projeto, são mais inclinados a um modelo econômico liberal, o que na prática significa que Lula “não terá um cheque em branco para gastar”.
Morelli destaca, entretanto, que o candidato à Presidência é diferente do presidente eleito e, com isso em vista, Lula deve adotar uma postura mais centrada e conciliadora durante os seus anos de governo.
“Podemos especular ou podemos olhar para o passado. Eu prefiro olhar para o passado. O Lula já esteve no poder e não ignorou o lado fiscal, não foi irresponsável fiscalmente. Riscos existem, mas olhando para o passado, ele oferece riscos aceitáveis para o teto de gastos, para a economia”, afirma o estrategista.
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