BC agiu antes da maioria das grandes economias, mas taxa brasileira já subiu bem mais – e não há garantias nessa parada. É a inflação que vem levando os bancos centrais a subirem os juros em todo o mundo. Mas, nessa superquarta, enquanto o Federal Reserve (FED) promoveu a quinta alta consecutiva nas taxas dos Estados Unidos, por aqui o Banco Central encerrou o ciclo de elevações e manteve a nossa Selic estável.
Olhando só por esse viés, a economia brasileira parece dar mostras de que vai bem, obrigada – pelo menos na comparação com outras grandes economias, já que até a zona do euro subiu os juros no começo do mês para tentar controlar a alta de preços.
Juros dos EUA sobem pela quinta vez no ano; taxa é a maior desde 2008
Qual é a mágica brasileira? A resposta tem, em alguma medida, ligação com um trauma nacional: a hiperinflação.
Quando, ainda no começo de 2021 – a partir de uma combinação da alta do dólar, valorização global do petróleo e seca – a inflação brasileira começou a ganhar tração, o BC não esperou para ver: colocou em marcha a primeira alta da Selic desde 2016, apesar do crescimento então pífio da economia e do desemprego próximo aos 15%.
Enquanto isso, o resto do mundo – que também sofria ainda com a crise provocada pela pandemia da Covid-19 – segurou as pontas, mesmo vendo os preços subindo, e manteve juros baixos e políticas de estímulo inalteradas.
Até que a guerra na Ucrânia mudou o panorama no primeiro semestre deste ano, e fez disparar os preços dos combustíveis (de que a Rússia é grande produtor) e dos alimentos (prejudicados pelas dificuldades de exportação da Ucrânia, grande produtora de grãos).
Quem começa a correr antes, chega antes à linha de chegada. Pelo menos até precisar começar a correr outra vez. A inflação no Brasil (apesar das últimas duas taxas mensais negativas) ainda não está exatamente controlada e sua queda vem fortemente apoiada nos cortes de impostos sobre os combustíveis e no recuo dos preços globais do petróleo.
É por isso que o comunicado em que o BC anuncia a manutenção da taxa nesta quarta foi claro: se a inflação pesar de novo, a Selic volta a subir.
“O Comitê reforça enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados e não hesitará em retomar o ciclo de ajuste caso o processo de desinflação não transcorra como esperado”, diz o texto. Recado mais claro, impossível.
Já nos Estados Unidos não há nem dúvida: vai subir de novo, e vai subir forte. E o mesmo pode acontecer na Europa, mais dependente da energia russa e dos grãos da Ucrânia que o resto do mundo.
E por aqui, mesmo que tenha parado de subir, a taxa de juros – que por sinal é a mais alta do mundo em termos reais – não volta a cair tão cedo. O mercado prevê os juros nos mesmos 13,75% no final do ano, com uma queda discreta para 11,25% até o final de 2023.
É um longo tempo para manter juros altos, com a economia ainda ganhando tração, o emprego se recuperando ainda de forma precária, com rendimentos baixos, e uma população altamente endividada.
O Brasil começou a tomar o remédio antes, e a dose é amarga – e, mesmo assim, pode ter que ser repetida.
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