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Limitarismo econômico: e se riqueza tivesse limite?

Limitarismo econômico: e se riqueza tivesse limite?


A ideia não tem a ver com socialismo ou comunismo. Ela não rejeita a acumulação de riqueza, a posse de propriedades privadas nem um certo grau de desigualdade social. Apenas diz que ter muito, às vezes, é demais. Superiates na Flórida, nos Estados Unidos
AP
Quando alguém oferece mais de US$ 40 bilhões pelo Twitter, pontes são desmontadas para transportar megaiates e os super-ricos enriquecem cada vez mais, algo está muito errado, argumenta um grupo de filósofos. Muitos dizem que nunca se pode ser rico demais. Mas o crescimento da desigualdade econômica cada vez mais faz pensar que está errado: há quem seja, de fato, demasiado rico.
Há uma longa lista de economistas, filósofos e líderes que, ao longo dos séculos, focaram na distribuição de riqueza. Sistemas políticos inteiros foram criados através da ideia de igualdade e compartilhamento.
O que é limitarismo?
O conceito de limitarismo econômico explora a ideia de que ninguém deveria ser excessivamente rico e frisa os danos e riscos de que haja super-ricos. Ao discutir a desigualdade, seus adeptos não abordam os problemas da pobreza ou do aumento de pobres; mas sim concentram-se nas consequências de ter demais.
A intenção ao colocar um limite máximo na riqueza que um único ser humano pode acumular não é punir. A ideia é incentivar mudanças positivas para o sistema econômico e para a população em geral através de progressos sociais. Além disso, em algum momento “dinheiro excedente” não aumenta mais o bem-estar ou gera uma vida próspera. Alguns milhões de dólares devem bastar, na maioria dos casos.
O limitarismo não é socialismo nem comunismo. Ele não rejeita a acumulação de riqueza, a posse de propriedades privadas nem um certo grau de desigualdade social. Apenas diz que ter muito, às vezes, é demais.
Atualmente, a teoria não define “demais” em termos de números concretos. Portanto, não há um ponto definido em que ela vá interferir e denunciar riqueza excessiva, quer se trate de 10 milhões, 150 milhões ou mesmo 2 bilhões de dólares.
De onde surgiu a ideia?
Por trás do limitarismo econômico está uma pesquisadora em particular: Ingrid Robeyns, teórica belga que trabalha na Universidade de Utrecht, Holanda. Ela pesquisa e leciona no departamento de Filosofia, com foco em ética, filosofia política e justiça social.
Ela apresentou pela primeira vez a ideia do limitarismo num congresso em 2012, mas levou alguns anos até seu primeiro ensaio acadêmico sobre o tema ser publicado. Desde então, ela tem falado incansavelmente sobre o tema, publicando artigos e trabalhando num livro. A ideia gerou reações diferentes pelo mundo afora.
“Na Europa, minha experiência diz que o público compartilha muitos dos argumentos do limitarismo. Nos EUA, porém, é uma ideia muito distante das discussões que ocorrem nos debates do mainstream”, explicou Robeyns à DW.
“Parte da cultura tradicional americana é a ideia do sonho americano – a crença de que todos teriam uma chance de se tornar muito ricos, se se dedicarem.”
Cada bilionário é um fracasso político?
A teoria também vai muito além de simplesmente estudar para a desigualdade de renda: a ética está no cerne do limitarismo.
Quando é moralmente ou eticamente necessário intervir num sistema econômico de livre mercado em benefício da sociedade como um todo?
Os indivíduos ricos acrescentam à sociedade ao investir no aumento da produtividade, ou apenas especulam, exploram empresas – ou países em desenvolvimento inteiros – até que nada sobre? Ter dez carros é realmente tão melhor assim do que ter dois?
“Alguns, agora, usam o slogan ‘todo bilionário é um fracasso político’. Acho que está certo. Porém mesmo uma situação em que alguns super-ricos têm muito menos de 1 bilhão, é moral e politicamente problemática”, afirma Robeyns.
Em geral, ela argumenta que o limitarismo é construído sobre duas colunas principais: proteger a democracia e abordar necessidades urgentes não atendidas ou problemas de ação coletiva na sociedade, como as mudanças climáticas.
Considerando a desigualdade política, o limitarismo teme que a desigualdade possa minar a democracia. Os ricos podem usar o dinheiro para influenciar políticos, contratar lobistas e colocar suas agendas em prática por meio de leis. Mesmo que isso não funcione, eles podem influenciar a opinião pública sendo donos de empresas de mídia ou financiando think tanks.
Grande riqueza pode comprometer combate a mudanças climáticas
O limitarismo econômico também pressupõe que uma distribuição mais igualitária da riqueza levaria a uma maior qualidade de vida no mundo em geral, ajudaria quem vive em extrema pobreza a prosperar.
“Se você já tem 10 milhões, receber mais 100 mil euros ou dólares não acrescenta muito ao seu estilo de vida . Mas para quem não tem riqueza nenhuma, qualquer acréscimo é significativo”, significando menos fome, menos casas sem calefação e menos crianças vivendo na pobreza, segundo Robeyns.
Mas não se trata apenas de dinheiro: partidários do limitarismo econômico consideram os ricos um perigo para o meio ambiente, sendo responsáveis por enormes pegadas carbônicas.
“Os super-ricos causam mudanças climáticas desproporcionalmente maiores, porque seus estilos de vida materiais são muito mais abundantes e seus investimentos, ecologicamente prejudiciais”, critica Robeyns. “Pode-se, portanto, argumentar que seria justo usar seu dinheiro excedente no combate à crise climática, em vez de deixá-los construir bunkers ou vilas de luxo no topo das montanhas, para se esconderem caso a mudança climática saia de controle e irrompa agitação civil.”
Tomar algumas dessas riquezas poderia ajudar na adaptação climática, os governos poderiam investir em sistemas para proteger os cidadãos das condições climáticas extremas. Paralelamente, poderiam implementar fontes de energia renovável ou melhores tecnologias.
E os ricos continuam ficando mais ricos
Alguns críticos acreditam que o limitarismo econômico não vai suficientemente longe; as empresas também deveriam se enquadrar nas diretrizes do limitarismo. Por sua vez, outros filósofos e economistas discordam veementemente da ideia de limitar a riqueza. Para eles, não há limites morais para as riquezas ganhas ou herdadas: na verdade, seria a chance de se tornar rico que impulsiona os empresários a assumir riscos, inventar e provocar mudanças.
Além disso, os críticos argumentam que limitar a riqueza não acabará com a desigualdade política. Medir riqueza ou bem-estar é simplesmente impossível de qualquer forma; uma maneira mais eficaz de alcançar mais igualdade seria um sistema tributário mais avançado.
No entanto, o fato é que os ricos estão cada vez mais ricos: lista de bilionários de 2022, apresentada pela Forbes, reúne 2.668 deles, que juntos possuem 12,7 trilhões de dólares. É um pouco menos do que no ano anterior, já que as crises globais tiveram um custo, porem há “mais de mil bilionários que são mais ricos do que eram há um ano”.
Há como colocar em prática a teoria limitarista?
A própria Ingrid Robeyns, no entanto, reconhece que a implementação de suas ideias implica problemas reais. Em primeiro lugar, é quase impossível chegar a uma definição universal do que é ser demasiado rico. Segundo, mesmo que houvesse uma definição, como se recolheria o dinheiro excedente?
Para a pesquisadora, o consolo é que que os filósofos existem para fazer perguntas e não para confiscar colares de diamantes ou jatos particulares:
“Ideias podem mudar a história. Algumas mudam, outras, não.” Suas ideias podem ser impopulares em alguns lugares, mas pelo menos fazem refletir sobre as desigualdades.
“Meu papel como filósofa e acadêmica é apresentar esses argumentos, mas cabe aos cidadãos e líderes dos domínios econômico, político e religioso dar os passos para tornar realidade um mundo assim.”
Autor: Timothy Rooks

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